Resolução 4131/2013 e devolução de linhas: o que fazer ?
Enviado: 14 Fev 2014, 13:39
Recebi por e-mail este texto, escrito por Francisco Oliveira e André Louis Tenuta, e encaminhada por e-mail a mim por Antonio Pastori.
Vamos debater sobre isso ?
LINHAS DEVOLVIDAS
O QUE FAZER?
É sugerida a destinação das linhas devolvidas a uma empresa ferroviária operadora
federal, como condição para colocar novamente este patrimônio a serviço da
sociedade. Sugere-se a já existente CBTU como núcleo desta empresa.
Introdução
Certamente o único aspecto positivo da Resolução 4.131, do ponto de vista da
Nação brasileira, foi a oficialização da devolução de 4.000 km de linhas pela
Concessionária FCA.
Se bem administrada e explorada, esta devolução pode significar a retomada
destas linhas para o uso e serventia da Sociedade brasileira como um todo, e não,
como é agora, apenas para o usufruto de meia dúzia de empresas que exploram
em larga escala o solo brasileiro, exportando-o em forma de minério ou de grãos.
Entretanto, lamentavelmente, mais uma vez a comunidade nacional é colocada em
sobressalto, com a anunciada disposição da ANTT expressa na Resolução, de, em
vez de promover este novo uso expandido, muitíssimo ao contrário, a de
patrocinar o seu arrancamento e destruição.
A simples menção de uma atitude como esta constitui uma ofensa intolerável a um
patrimônio nacional, construído a duras penas pelo esforço das inúmeras gerações
que nos antecederam neste SÉCULO e MEIO anterior. O balanço ao final destes 17 anos de Concessão da FCA é uma mistura de linhas
em estado médio, linhas em estado precário, linhas abandonadas e já sem
condições de uso, e de linhas totalmente depredadas, roubadas e invadidas. E os
4.000 km em devolução contêm exatamente este espectro de linhas.
A discussão sobre a indenização cabida pela Concessionária por conta da
degeneração e abandono de cerca de 1.700 destes 4.000 km é um capítulo à parte
neste tema, vem sendo cuidado pelo Ministério Público, e não será tratado aqui.
Nossa discussão se atém a propor um mecanismo que, do ponto de vista da
emergência, impeça que os 2.300 km ainda utilizáveis se percam, e que do ponto
de vista do longo prazo, permita a re-incorporação ao serviço da sociedade do que
está degenerado, e, além disso, prepare a Nação para receber quaisquer outras
linhas que venham a ser devolvidas no futuro, as incorporando imediatamente.
Uma simples observação da imagem anterior permite apreciar a extensão das
linhas em processo de devolução (em amarelo), evidenciando a urgência de uma
proposta e da tomada de ação para que não se perca tamanho patrimônio.
Que a Concessionária devolva as linhas, mas que esta devolução termine por
significar e desencadeamento de um avanço, e não, de mais um retrocesso.
O que se deve fazer?
O desafio que a sociedade brasileira tem agora pela frente é o de, rapidamente,
propor um mecanismo que mantenha as linhas vivas, em uso, servindo à Nação.
Não há sentido algum em uma manutenção que não seja com este objetivo.
Então, a principal pergunta a ser respondida é COMO mantê-las vivas? Ou, O QUE
SE DEVE FAZER?
O que não se deve fazer!
Em função da enormidade da extensão das linhas em processo de devolução, em
função da enorme diversidade de situações que elas trazem consigo, e em função
da exigüidade do tempo disponível, a última coisa que a sociedade brasileira deve
fazer agora é discutir o que fazer caso a caso. A solução para ser factível,
aproveitável, implementável, menos sujeita a erros e atender automaticamente
aos casos futuros que surgirão tem de ser uma SOLUÇÃO GERAL.
Buscar neste momento por soluções para cada linha em particular, é enveredar
pelo caminho do custo elevado, da demora insuportável, das ingerências políticas
locais, das incertezas nas decisões e das elevadas possibilidades de erro e
arrependimento posterior! Não há que se perguntar agora por projetos específicos em cada linha como sendo
a espada na balança do fica ou não fica. Não temos tempo para isto. Todas ficam.
Todas devem ficar. Nunca devemos esquecer que toda linha foi construída para
atender demandas existentes. Nunca linha alguma foi construída para não atender
nada. E, se no passado haviam demandas, o que dirá no presente, quando TODAS
as demandas cresceram, em TODAS as áreas.
Muito cuidado com as “anti-econômicas”!
Além disso, especial cuidado é necessário para que nossa decisão sobre o futuro
das linhas não seja contaminada por idéias e chavões que só tem servido para
justificar o injustificável. Um destes é a “conveniente” afixação da classificação de
“anti-econômica” a diversos trechos pelos quais a Concessionária não se
interessou. “Anti-econômicos” estes trechos são apenas na visão que a
Concessionária quer que se tenha, para justificar seu abandono. O que estes
trechos de fato não têm são os clientes pelos quais a Concessionária se interessa.
Ou seja, grandes volumes de alguma coisa só, em geral do tipo daquelas que
pesam muito, valem pouco e não dão trabalho algum.
Vejamos, por exemplo, o caso da chamada “Linha Mineira”. Sistematicamente,
após a concessão a FCA vai eliminando todas as atividades ferroviárias nela ainda
existentes, argumentando uma anti-economicidade difícil de imaginar.
Afinal, ao seu longo estão pólos muito importantes para o Estado de Minas em
todas as áreas. Sabará com 150.000 habitantes, Nova Lima com 120.000 e Rio
Acima 15.000 na Região Metropolitana com forte demanda de transporte de massa.
Ibirité com 70.000 habitantes, Ouro Preto com 100.000, Mariana 70.000, Ponte
Nova com 80.000, Viçosa com 100.000, Ubá com 120.000 e Cataguases com
90.000 habitantes. A linha concentra ao seu longo, atividade de mineração de
ferro, ouro e bauxita. Ela também contempla a indústria siderúrgica, e várias de
laticínio, tecelagem e de papel. Ubá é um dos principais pólos moveleiros do país
com mais de 500 indústrias do setor. Apenas as Universidades de Ouro Preto e de Viçosa reúnem uma população flutuante da ordem de 50.000 estudantes, e cerca
de 700 eventos como Congressos e Seminários são produzidos anualmente apenas
nestes dois locais. Todas estas atividades são fortes geradores de necessidade de
viagens de passageiros e de transporte de cargas, tudo isto sem falar do fluxo
estimado de 700.000 turistas anuais apenas a Ouro Preto, vindos da capital.
Mas, nada disto seduziu a FCA, que a abandonou à depredação. Por conta do
desaparecimento da alternativa ferroviária e do crescimento constante das
atividades comerciais, escolares e turísticas em todo este trajeto, já se fala agora
na necessidade de duplicar a rodovia Belo Horizonte – Ouro Preto, evidentemente
empreendimento muito mais caro a curto e longo prazo do que recuperar e
adequar a ferrovia. Além disso, a “linha mineira” coloca cargas originadas em Minas Gerais, em
contato direto com a linha ferroviária fluminense que se dirige a Campos no
Estado do Rio de Janeiro, onde o porto exportador de Açu está sendo finalizado..
Como possivelmente uma linha como esta pode ser “anti-econômica”? Pois é o que
a Resolução 4.131 diz.
Portanto, deve-se desconsiderar qualquer tentativa de solução baseada em rótulos
“econômicos” vindos das Concessionárias.
Cuidado com as Audiências!
Igualmente arriscado é se basear nos resultados das Audiências realizadas pela
ANTT em algumas cidades, para “tomada de subsídios” para as decisões sobre o
que fazer com as linhas. Acontece que o uso ferroviário pela sociedade foi
desestimulado e abafado durante DÉCADAS. Como é que se pode querer ouvir
propostas de uma sociedade que cresceu sem entender e saber que trem também
transporta gente? Sem saber que trem também transporte pacotes? Que trem
também pode atender a sociedade e não apenas a mega-empresas?
Tudo que este estado de coisas conseguiu foi afastar a sociedade da ferrovia, e
esta é a raiz de tanto descontentamento com as linhas urbanas, e da enxurrada de
pedidos de transformar trilhos em avenidas, estas sim, que sempre serviram às
pessoas.
Como querer escutar projetos de uma sociedade que não tem material
rodante nenhum a seu dispor? Por acaso as linhas serão devolvidas com o
material rodante que nelas atuava? Claro que não. Então, é claro que não haverá
projeto a ser anotado. Ou se houver, serão projetos muitíssimo longínquos, que,
se algum dia se materializarem, já não encontrarão mais a linha. E os poucos projetos que aparecerão serão frutos da insistência de um grupo
abnegado de heróis, que mesmo com tanto desfavorável ainda consegue manter
vivos seus sonhos, e suas visões do melhor para a sociedade.
Dê tempo à sociedade, e mantenha a condições (linhas) que projetos aparecerão.
Mas, mesmo se não houver projetos agora, potenciais existem. Todos nós
sabemos. Trens de Passageiros. Trens Turísticos. VLTs. Trens de Carga Geral.
Combinação deles. Longa Distância. Short lines. Etc.
O raciocínio e a conversa não podem ser apenas em cima de projetos. Neste
momento ela tem de ser sobre possibilidades, desejos e sonhos.
Necessidades básicas.
Mas, qualquer que seja, todos começam pela existência de uma Linha. Onde há
uma linha é possível sonhar. Onde não há mais linha alguma, não há mais sonho
ou possibilidade alguma. É onde tudo começa. O resto vem a seguir, e é
comparativamente mais fácil de resolver. Daí a necessidade de se manter as linhas
a todo custo. Não apenas por terem custado o esforço de gerações, mas porque
tudo começa delas.
Não há pecado em não se conseguir visualizar, hoje, tudo o que poderia acontecer
em uma linha. Não dá para exigir isto de ninguém. Mas, deve-se exigir a
precaução de mantê-la.
E todas as iniciativas possuirão as mesmas necessidades básicas: Linhas em
condições; Material rodante; Manutenção (de linhas, rodante, instalações).
Mas, QUEM?
Se tudo começa pelas linhas, o urgente a ser discutido agora é; QUEM deve
receber estas linhas que estão sendo devolvidas? QUEM tem condições de recebê-
las, mantê-las, disponibilizá-las, e coordenar o seu uso?
E a resposta é a seguinte: Dentro da babel jurídica atualmente instalada,
NINGUÉM tem esta condição.
Tudo começa por entender e aceitar que o modelo legal existente já deu mostras
de ser completamente inexeqüível. A sopa de siglas na qual o ferroviarismo
nacional foi jogado só produziu encolhimento da malha, prejuízos à Nação,
depredação, agravamento das condições das rodovias, exclusão da
população e favorecimento a algumas empresas em detrimento da
sociedade.
Jamais as linhas serão preservadas dentro deste mesmo esquema que até agora
só se mostrou incapaz e desinteressado.
Entregá-las para a “guarda” do DNIT é o mesmo que condená-las à destruição:
seja pelo total desmazelo, pela total falta de interesse ou pela total falta de
condições de as “guardar”, ou, seja pela impressionante facilidade com que
qualquer um que ali encoste consegue “autorização” para erradicar qualquer
trecho onde não se circule no momento.
Ali, a “guarda” que o DNIT deveria fazer da linha férrea se converte em um “termo
de guarda”, onde o autorizado se compromete a “guardar” trilhos, dormentes,
ferragens e tudo o mais arrancado para a implantação de mais uma avenida. É
assim que as linhas férreas nacionais vem sendo “guardadas”. Desmontadas. Sob
o asfalto, de onde nunca mais emergirão.
Portanto este é um MODELO ESGOTADO, e outro é necessário urgentemente.
Não adianta entregar linhas para um órgão que não tem a mínima tradição
ferroviária. Não adianta entregar linhas para quem não tem um único Auto de Linha para as inspecionar. Não adianta entregar linhas para quem não opera trens.
Não adianta entregar linhas para quem não tem condições e nem vocação para
fazê-las voltar funcionar e servir à sociedade. Não adianta entregá-las ao DNIT.
TEMOS DE DEFINIR URGENTEMENTE UM OUTRO RECEPTOR PARA ESTAS
LINHAS.
E, um receptor que tenha condições técnicas, legais, humanas, operacionais e
materiais para inspecionar, manter, operar, controlar, transitar, desenvolver usos
e mesmo ampliar linhas é, certamente, uma EMPRESA OPERADORA
FERROVIÀRIA.
E, para que esta EMPRESA possa receber bens federais, receber verbas federais e
trabalhar visando não o lucro, mas as necessidades da Nação, esta tem de ser
obrigatoriamente uma EMPRESA OPERADORA FERROVIÁRIA FEDERAL.
Sumarizando. Se desejarmos que estas linhas se mantenham, voltem à vida,
cresçam e tenham futuro, sem ameaças de retrocessos, temos de entregá-las a
uma OPERADORA FEDERAL.
No resto do mundo
Ao se desfazer, em 1996, da RFFSA, uma operadora ferroviária de âmbito
nacional, o Brasil passou a andar na contra-mão das experiências e modelos
internacionais mais bem sucedidos.
Todos os grandes países têm operadoras públicas ferroviárias de carga e
passageiros, com controle público centralizado de toda a malha. Na França,
Espanha, China, Rússia, Estados Unidos e Índia, o transporte de cargas e
passageiros é feito majoritariamente por empresas públicas, que recebem
subsídios para equalizar receitas e custos operacionais.
A maior empresa ferroviária européia, a Deutsche Bahn, é uma empresa pública
lucrativa e de alta produtividade, o governo alemão não abre mão do seu controle e só permitiu que 25% do seu capital fosse privado com o lançamento de ações.
Outra grande empresa ferroviária européia, a British Rail, sofreu um processo de
privatização que não funcionou e que teve que ser revisto. O principal problema foi
a falta de coordenação entre as mais de 100 unidades que passaram a ser
operadas pela empresas privadas, e ficou patente que é imprescindível uma
coordenação pública, e um controle centralizado da operação, a nível nacional.
Estados Unidos e Canadá têm empresas públicas de abrangência nacional que
operam o transporte ferroviário de passageiros, a AMTRAK e a VIA RAIL, e há
muito tempo descartaram a possibilidade de privatização destas empresas, que
atendem mais de 500 destinos.
O transporte de cargas é feito por empresas ferroviárias privadas, que estão
abertas a transportar qualquer tipo de carga, e submetem-se ao eficiente controle
e fiscalização de 2 agências reguladoras federais, uma para operação e outra para
segurança. O transporte de cargas em ambos países é feito por poucas empresas
privadas de grande porte, e por dezenas empresas ferroviárias de pequeno e
médio porte (short lines) que alimentam as linhas troncos de longa distância.
As operadoras de carga americana incentivam a criação e expansão de atividades
econômicas que possam demandar transporte ferroviário, em suas áreas de
influência.
A experiência da gestão das ferrovias européias e norte-americanas nos apresenta
algumas lições:
• O controle e a gestão da malha ferroviária necessariamente têm que ser
centralizado e de responsabilidade das autoridades públicas, as quais cabe a
responsabilidade de definir o melhor uso da via permanente para atender os interesses
regionais e nacionais, e não apenas o interesse de grandes demandadores de carga.
• A via permanente, material rodante e instalações são de propriedade pública, mas
a operação e a manutenção de partes da malha podem ser terceirizadas, deste que as
existam órgãos públicos regulamentadores e fiscalizadores independentes de injunções
políticas, e que sejam eficientes e transparentes;
• O poder concedente deve ter competência técnica e administrativa para
assumir a operação do material rodante e da manutenção da malha
ferroviária, quando por qualquer motivo o operador privado terceirizado
deixar de operar;
• As empresas ferroviárias públicas européias têm administração profissional
competente, em geral com imunidade a manipulações políticas e interesses
eleitoreiros;
• A manutenção da via permanente é uma obrigação do estado, da mesma forma que
a manutenção de ruas e rodovias também o é. Os valores gastos nestas atividades
não podem ser computados como subsídios;
• Embora muitas das ferrovias públicas européias e americanas sejam lucrativas,
para o atendimento a todas regiões e a toda população são necessários subsídios
governamentais. Nestes países a concessão de subsídios está vinculada a metas de
eficiência e produtividade que têm que atingidos pelas concessionárias ou
permissionárias.
• Os benefícios econômicos proporcionados por ferrovias subsidiadas, como o
aumento da receita tributária, incremento da competitividade, geração de emprego e
renda, desenvolvimento regional, fortalecimento da indústria de material ferroviário,
redução do consumo de combustíveis fósseis e de acidentes, e estímulo ao turismo,
superam em muito os montantes de subsídio. Ou seja, na realidade o subsídio é uma
forma de investimento que traz retornos para o conjunto da economia sob a forma de
externalidades positivas.
A opção por abandonar completamente a operação ferroviária fragilizou o país, e
não há como o Brasil não voltar a contar com uma operadora federal de
abrangência. Não há outra forma de conciliar, conservação, utilização, expansão,
controle, garantia de operação, e universalização com o atendimento aos
interesses verdadeiramente legítimos da Nação.
Alternativas
Nesta linha temos de saída 2 alternativas: uma empresa federal NOVA, ou, uma
empresa federal já EXISTENTE.
Não pode haver dúvidas na vantagem de uma empresa EXISTENTE sobre uma
empresa NOVA. Não se depende de criação alguma, com todas as demoras,
negociações, despesas, influências, etc que isto implica. Uma empresa já existente
pode começar a trabalhar “amanhã” nas novas linhas, bastando talvez um
pequeno e rápido acerto estatutário.
O Brasil tem hoje 3 empresas ferroviárias federais nesta linha. A CBTU, a
TRENSURB e a VALEC, cabendo definir a mais conveniente.
Quadro Comparativo das Características das Empresas Ferroviárias Nacionais Existentes
Obviamente a CBTU se desponta como a escolha, pois, embora as características
da TRENSURB e da CBTU sejam semelhantes, a primeira tem a grave deficiência
da operação em um único Estado. Já a VALEC, é uma empresa sem experiência
alguma em operação, se atendo até o momento ao gerenciamento de novas
implantações.
Na realidade a empresa escolhida será essencialmente um núcleo para a nova
operação.
Consideremos a escolha da CBTU como este núcleo. Apesar de ter atuação em
operação, manutenção, conservação, linha, etc, todas estas atuações serão
fortemente expandidas. Sua atuação passará a ter uma abrangência nacional, e
seu envolvimento não se restringirá a passageiros urbanos, mas também a outras
demandas. Por conta desta ampliação de escopo, sugere-se inclusive, uma
mudança de nome para acomodar esta transformação, que poderia passar a ser
CBTF- Companhia Brasileira de Transportes Ferroviários.
Atuação da CBTF (vamos manter este nome ao longo desta discussão)
Este momento, precipitado pelas devoluções da 4.131, é um momento critico, e
decisões têm de ser tomadas de forma emergencial. Não que a implantação de
uma CBTF seja coisa descartável e passageira. Muito ao contrário, a situação de
pânico, confusão, e de possibilidade de depredação que a própria 4.131 cria é
fruto único e exclusivo da inexistência de uma CBTF, que, caso existisse, receberia
automaticamente e sem dor alguma, as linhas devolvidas.
Então, incluindo a situação do momento atual, a CBTF,
• Recebe as linhas.
• Recebe o material rodante.
• Recebe as instalações, faixas de domínio, etc. Na realidade ela pode passar a ser a detentora imediata de TODO o patrimônio
ferroviário federal, móvel e imóvel, mesmo aquele ainda em concessão, de forma
que qualquer devolução posterior, já encontre o dono e receptor correto e definido.
São suas atribuições.
• Monitorar e resguardar todos os trechos recebidos, assim
como as Estações e todas as instalações.
• Manter as linhas em condições funcionais.
• Manter e recuperar o material rodante eventualmente
recebido.*
• Continuar as operações urbanas atuais.
• Implantar novas operações de passageiros urbanas,
metropolitanas, intermunicipais e interestaduais nas suas
linhas atuais e nas Devolvidas.
• Implantar novas operações de carga metropolitanas,
intermunicipais e interestaduais suas linhas atuais e nas
Devolvidas.
• Desenvolver outros usos, como locação, tração de
composições alheias, venda de direitos de passagem, etc.
• Operar CCO próprio das suas linhas.
• Apoiar à Polícia Ferroviária Federal na guarda da malha
total.
• Conveniar com entidades de ensino para uso e aproveito
das instalações como unidades de ensino profissional
ferroviário, nas áreas administrativas, manutenção, operação,
projeto, etc.
• Incentivar a intermodalidade de passageiros e cargas.
* Quanto a este item, deve-se lembrar que, assim como as linhas, as condições
do material rodante variam enormemente. Existe material rodando, material
recuperável para uso ferroviário, material recuperável para uso cultural e material
irrecuperável. Até agora, indiferentemente da situação na qual qualquer material,
linha ou instalação tenha sido entregue o DNIT, como esta Autarquia não usa ou
opera nada, seu destino é o abandono. Uma nova destinação, a um operador,
evitará que tudo se perca como tem sido inevitavelmente até agora.
Especificamente quanto às Linhas, imaginam-se as seguintes atribuições e
situações:
• Mantém as linhas atualmente em seu poder.
• Recebe as linhas Devolvidas e que forem sendo Devolvidas,
tanto as ainda transitáveis, quanto aquelas depredadas.
• Recebe as linhas abandonadas que não foram objeto de
Concessão.
• Dá manutenção e modernização nas linhas transitáveis.
• Trabalha pela recuperação das linhas depredadas.
• Trabalha na implantação de Novas linhas menores.
Como ela é uma EMPRESA PÚBLICA FEDERAL, suas fontes de receita serão:
• Aportes federais.
• Venda de direito de passagem.
• Operação de composições próprias.
• Implanta linhas de cargas, de passageiros ou mistas.
• 'Puxa' composições alheias.
• Aluga material rodante.
• Vende manutenção.
• Explora ativos.
• Recebe as indenizações impostas às Concessionárias por
descumprimento de Contrato, e usa na recomposição de linhas.
• Venda de inservíveis (de fato).
• Convênios.
• Investimentos compartilhados com outros entes estatais
ou particulares.
Quando se diz Implanta, na realidade deve-se ter em mente que a Implantação
pode ser diretamente sua ou de outro Operador. Na realidade, uma suas mais
importantes funções é também a de ser um Facilitador de Implantação.
Um dos mais caros objetivos a ser perseguido aqui deve ser aquele de ampliar o
número de Operadores. As vantagens desta ampliação são:
• Uso ampliado pela sociedade do patrimônio federal.
• Ocupação mais ampla e diversificada de nichos como
cargas, turismo, mistos, eventos, especiais, históricos,
comemorativos, etc.
• Os investimentos não serão unicamente estatais.
• Preços melhores e mais competitivos.
• Enorme ampliação dos postos de trabalho ligados à
ferrovia.
• Reversão do distanciamento da população para com a
ferrovia.
• Aceleração do processo de reversão e recuperação de
Estações, linhas e rodante abandonados.
• Ampliação das operações intermodais de carga e
passageiros.
Precificação no Modelo CBTF
A questão da precificação de itens como direito de passagem, aluguel de
máquinas e outros, deve ser precedida de cuidadosa avaliação para que, mesmo
dentro deste novo modelo, não voltemos a assistir à ditadura de umas poucas
operadoras sobre o resto da sociedade.
A cessão de direito de passagem deve se dar até o ponto onde outras operações,
que diversificam a linha, não sejam inviabilizadas.
Pelo mesmo motivo, Leilões como definidores de preços, também pode concorrer
para inviabilizar operações menores.
Não há sentido em receber linhas de volta de uma única operadora excludente, e
entregá-las para outra.
O modelo da precificação é um modelo aberto ainda.
Vantagens do Modelo CBTF
A CBTF deve ter gestão técnica e profissional, recursos humanos e financeiros
adequados, com o mínimo de interferências políticas. Não se trata aqui de evitar a
implantação de uma estrutura como esta, por conta dos pecados da extinta RFFSA.
Com a mesma facilidade com que alguns deles como o empreguismo são
prontamente elencados quando se fala em uma estrutura como esta, suas virtudes
são esquecidas. Apenas para citar uma, no Rio de Janeiro, seus trens de subúrbio
chegaram a carregar 1.200.000 de passageiros diários. Hoje, após 16 anos de
investimento e gerência privadas, nem 500.000 conseguem embarcar.
Embora uma estrutura de abrangência nacional como esta não seja uma coisa
trivial, usar o núcleo CBTU, como aqui sugerido, facilita e acelera tudo, pois,
afinal, trata-se apenas da ampliação do seu escopo.
A CBTU é uma Empresa Federal, pronta, em funcionamento, que opera em vários
Estados, possui corpo técnico, instalações, oficinas e procedimentos internos que
automaticamente darão suporte às novas funções incorporadas. Além disso, temos
o fato extremamente importante de que como ela já opera com passageiros, não
há rejeição alguma a atuação nesta área.
Esta é inclusive uma excelente oportunidade para corrigir as questões que
necessitam correção na CBTU atual, e também de substituir a discussão recorrente
da dissolução ou estadualização da CBTU em alguns locais, por uma discussão
totalmente diversa, ou seja, aquela onde ela é, ao contrário, fortalecida e
ampliada.
Igualmente importante, é o fato de que a ampliação de escopo proposta significa a
virtual eliminação de CONFLITOS em diversas operações urbanas. Ou seja, nas
cidades a CBTU já opera, a implantação de novas linhas e linhas regionais se dará
tudo dentro da mesma empresa, facilitando e agilizando a resolução de quaisquer
conflitos potenciais. A Valec deverá continuar a projetar e acompanhar a construção das grandes linhas nacionais
Fica para um segundo momento a discussão da possibilidade de unificação do
controle do uso e da operação mesmo destas grandes linhas dentro do sistema da
CBTF. Esta é uma discussão que pode esperar mais um pouco, não é urgente, e
que pode muito se beneficiar da experiência acumulada pela CBTF no
gerenciamento das linhas disponibilizadas neste primeiro momento.
Equipe
Francisco Oliveira
André Louis Tenuta [/color]
Vamos debater sobre isso ?
LINHAS DEVOLVIDAS
O QUE FAZER?
É sugerida a destinação das linhas devolvidas a uma empresa ferroviária operadora
federal, como condição para colocar novamente este patrimônio a serviço da
sociedade. Sugere-se a já existente CBTU como núcleo desta empresa.
Introdução
Certamente o único aspecto positivo da Resolução 4.131, do ponto de vista da
Nação brasileira, foi a oficialização da devolução de 4.000 km de linhas pela
Concessionária FCA.
Se bem administrada e explorada, esta devolução pode significar a retomada
destas linhas para o uso e serventia da Sociedade brasileira como um todo, e não,
como é agora, apenas para o usufruto de meia dúzia de empresas que exploram
em larga escala o solo brasileiro, exportando-o em forma de minério ou de grãos.
Entretanto, lamentavelmente, mais uma vez a comunidade nacional é colocada em
sobressalto, com a anunciada disposição da ANTT expressa na Resolução, de, em
vez de promover este novo uso expandido, muitíssimo ao contrário, a de
patrocinar o seu arrancamento e destruição.
A simples menção de uma atitude como esta constitui uma ofensa intolerável a um
patrimônio nacional, construído a duras penas pelo esforço das inúmeras gerações
que nos antecederam neste SÉCULO e MEIO anterior. O balanço ao final destes 17 anos de Concessão da FCA é uma mistura de linhas
em estado médio, linhas em estado precário, linhas abandonadas e já sem
condições de uso, e de linhas totalmente depredadas, roubadas e invadidas. E os
4.000 km em devolução contêm exatamente este espectro de linhas.
A discussão sobre a indenização cabida pela Concessionária por conta da
degeneração e abandono de cerca de 1.700 destes 4.000 km é um capítulo à parte
neste tema, vem sendo cuidado pelo Ministério Público, e não será tratado aqui.
Nossa discussão se atém a propor um mecanismo que, do ponto de vista da
emergência, impeça que os 2.300 km ainda utilizáveis se percam, e que do ponto
de vista do longo prazo, permita a re-incorporação ao serviço da sociedade do que
está degenerado, e, além disso, prepare a Nação para receber quaisquer outras
linhas que venham a ser devolvidas no futuro, as incorporando imediatamente.
Uma simples observação da imagem anterior permite apreciar a extensão das
linhas em processo de devolução (em amarelo), evidenciando a urgência de uma
proposta e da tomada de ação para que não se perca tamanho patrimônio.
Que a Concessionária devolva as linhas, mas que esta devolução termine por
significar e desencadeamento de um avanço, e não, de mais um retrocesso.
O que se deve fazer?
O desafio que a sociedade brasileira tem agora pela frente é o de, rapidamente,
propor um mecanismo que mantenha as linhas vivas, em uso, servindo à Nação.
Não há sentido algum em uma manutenção que não seja com este objetivo.
Então, a principal pergunta a ser respondida é COMO mantê-las vivas? Ou, O QUE
SE DEVE FAZER?
O que não se deve fazer!
Em função da enormidade da extensão das linhas em processo de devolução, em
função da enorme diversidade de situações que elas trazem consigo, e em função
da exigüidade do tempo disponível, a última coisa que a sociedade brasileira deve
fazer agora é discutir o que fazer caso a caso. A solução para ser factível,
aproveitável, implementável, menos sujeita a erros e atender automaticamente
aos casos futuros que surgirão tem de ser uma SOLUÇÃO GERAL.
Buscar neste momento por soluções para cada linha em particular, é enveredar
pelo caminho do custo elevado, da demora insuportável, das ingerências políticas
locais, das incertezas nas decisões e das elevadas possibilidades de erro e
arrependimento posterior! Não há que se perguntar agora por projetos específicos em cada linha como sendo
a espada na balança do fica ou não fica. Não temos tempo para isto. Todas ficam.
Todas devem ficar. Nunca devemos esquecer que toda linha foi construída para
atender demandas existentes. Nunca linha alguma foi construída para não atender
nada. E, se no passado haviam demandas, o que dirá no presente, quando TODAS
as demandas cresceram, em TODAS as áreas.
Muito cuidado com as “anti-econômicas”!
Além disso, especial cuidado é necessário para que nossa decisão sobre o futuro
das linhas não seja contaminada por idéias e chavões que só tem servido para
justificar o injustificável. Um destes é a “conveniente” afixação da classificação de
“anti-econômica” a diversos trechos pelos quais a Concessionária não se
interessou. “Anti-econômicos” estes trechos são apenas na visão que a
Concessionária quer que se tenha, para justificar seu abandono. O que estes
trechos de fato não têm são os clientes pelos quais a Concessionária se interessa.
Ou seja, grandes volumes de alguma coisa só, em geral do tipo daquelas que
pesam muito, valem pouco e não dão trabalho algum.
Vejamos, por exemplo, o caso da chamada “Linha Mineira”. Sistematicamente,
após a concessão a FCA vai eliminando todas as atividades ferroviárias nela ainda
existentes, argumentando uma anti-economicidade difícil de imaginar.
Afinal, ao seu longo estão pólos muito importantes para o Estado de Minas em
todas as áreas. Sabará com 150.000 habitantes, Nova Lima com 120.000 e Rio
Acima 15.000 na Região Metropolitana com forte demanda de transporte de massa.
Ibirité com 70.000 habitantes, Ouro Preto com 100.000, Mariana 70.000, Ponte
Nova com 80.000, Viçosa com 100.000, Ubá com 120.000 e Cataguases com
90.000 habitantes. A linha concentra ao seu longo, atividade de mineração de
ferro, ouro e bauxita. Ela também contempla a indústria siderúrgica, e várias de
laticínio, tecelagem e de papel. Ubá é um dos principais pólos moveleiros do país
com mais de 500 indústrias do setor. Apenas as Universidades de Ouro Preto e de Viçosa reúnem uma população flutuante da ordem de 50.000 estudantes, e cerca
de 700 eventos como Congressos e Seminários são produzidos anualmente apenas
nestes dois locais. Todas estas atividades são fortes geradores de necessidade de
viagens de passageiros e de transporte de cargas, tudo isto sem falar do fluxo
estimado de 700.000 turistas anuais apenas a Ouro Preto, vindos da capital.
Mas, nada disto seduziu a FCA, que a abandonou à depredação. Por conta do
desaparecimento da alternativa ferroviária e do crescimento constante das
atividades comerciais, escolares e turísticas em todo este trajeto, já se fala agora
na necessidade de duplicar a rodovia Belo Horizonte – Ouro Preto, evidentemente
empreendimento muito mais caro a curto e longo prazo do que recuperar e
adequar a ferrovia. Além disso, a “linha mineira” coloca cargas originadas em Minas Gerais, em
contato direto com a linha ferroviária fluminense que se dirige a Campos no
Estado do Rio de Janeiro, onde o porto exportador de Açu está sendo finalizado..
Como possivelmente uma linha como esta pode ser “anti-econômica”? Pois é o que
a Resolução 4.131 diz.
Portanto, deve-se desconsiderar qualquer tentativa de solução baseada em rótulos
“econômicos” vindos das Concessionárias.
Cuidado com as Audiências!
Igualmente arriscado é se basear nos resultados das Audiências realizadas pela
ANTT em algumas cidades, para “tomada de subsídios” para as decisões sobre o
que fazer com as linhas. Acontece que o uso ferroviário pela sociedade foi
desestimulado e abafado durante DÉCADAS. Como é que se pode querer ouvir
propostas de uma sociedade que cresceu sem entender e saber que trem também
transporta gente? Sem saber que trem também transporte pacotes? Que trem
também pode atender a sociedade e não apenas a mega-empresas?
Tudo que este estado de coisas conseguiu foi afastar a sociedade da ferrovia, e
esta é a raiz de tanto descontentamento com as linhas urbanas, e da enxurrada de
pedidos de transformar trilhos em avenidas, estas sim, que sempre serviram às
pessoas.
Como querer escutar projetos de uma sociedade que não tem material
rodante nenhum a seu dispor? Por acaso as linhas serão devolvidas com o
material rodante que nelas atuava? Claro que não. Então, é claro que não haverá
projeto a ser anotado. Ou se houver, serão projetos muitíssimo longínquos, que,
se algum dia se materializarem, já não encontrarão mais a linha. E os poucos projetos que aparecerão serão frutos da insistência de um grupo
abnegado de heróis, que mesmo com tanto desfavorável ainda consegue manter
vivos seus sonhos, e suas visões do melhor para a sociedade.
Dê tempo à sociedade, e mantenha a condições (linhas) que projetos aparecerão.
Mas, mesmo se não houver projetos agora, potenciais existem. Todos nós
sabemos. Trens de Passageiros. Trens Turísticos. VLTs. Trens de Carga Geral.
Combinação deles. Longa Distância. Short lines. Etc.
O raciocínio e a conversa não podem ser apenas em cima de projetos. Neste
momento ela tem de ser sobre possibilidades, desejos e sonhos.
Necessidades básicas.
Mas, qualquer que seja, todos começam pela existência de uma Linha. Onde há
uma linha é possível sonhar. Onde não há mais linha alguma, não há mais sonho
ou possibilidade alguma. É onde tudo começa. O resto vem a seguir, e é
comparativamente mais fácil de resolver. Daí a necessidade de se manter as linhas
a todo custo. Não apenas por terem custado o esforço de gerações, mas porque
tudo começa delas.
Não há pecado em não se conseguir visualizar, hoje, tudo o que poderia acontecer
em uma linha. Não dá para exigir isto de ninguém. Mas, deve-se exigir a
precaução de mantê-la.
E todas as iniciativas possuirão as mesmas necessidades básicas: Linhas em
condições; Material rodante; Manutenção (de linhas, rodante, instalações).
Mas, QUEM?
Se tudo começa pelas linhas, o urgente a ser discutido agora é; QUEM deve
receber estas linhas que estão sendo devolvidas? QUEM tem condições de recebê-
las, mantê-las, disponibilizá-las, e coordenar o seu uso?
E a resposta é a seguinte: Dentro da babel jurídica atualmente instalada,
NINGUÉM tem esta condição.
Tudo começa por entender e aceitar que o modelo legal existente já deu mostras
de ser completamente inexeqüível. A sopa de siglas na qual o ferroviarismo
nacional foi jogado só produziu encolhimento da malha, prejuízos à Nação,
depredação, agravamento das condições das rodovias, exclusão da
população e favorecimento a algumas empresas em detrimento da
sociedade.
Jamais as linhas serão preservadas dentro deste mesmo esquema que até agora
só se mostrou incapaz e desinteressado.
Entregá-las para a “guarda” do DNIT é o mesmo que condená-las à destruição:
seja pelo total desmazelo, pela total falta de interesse ou pela total falta de
condições de as “guardar”, ou, seja pela impressionante facilidade com que
qualquer um que ali encoste consegue “autorização” para erradicar qualquer
trecho onde não se circule no momento.
Ali, a “guarda” que o DNIT deveria fazer da linha férrea se converte em um “termo
de guarda”, onde o autorizado se compromete a “guardar” trilhos, dormentes,
ferragens e tudo o mais arrancado para a implantação de mais uma avenida. É
assim que as linhas férreas nacionais vem sendo “guardadas”. Desmontadas. Sob
o asfalto, de onde nunca mais emergirão.
Portanto este é um MODELO ESGOTADO, e outro é necessário urgentemente.
Não adianta entregar linhas para um órgão que não tem a mínima tradição
ferroviária. Não adianta entregar linhas para quem não tem um único Auto de Linha para as inspecionar. Não adianta entregar linhas para quem não opera trens.
Não adianta entregar linhas para quem não tem condições e nem vocação para
fazê-las voltar funcionar e servir à sociedade. Não adianta entregá-las ao DNIT.
TEMOS DE DEFINIR URGENTEMENTE UM OUTRO RECEPTOR PARA ESTAS
LINHAS.
E, um receptor que tenha condições técnicas, legais, humanas, operacionais e
materiais para inspecionar, manter, operar, controlar, transitar, desenvolver usos
e mesmo ampliar linhas é, certamente, uma EMPRESA OPERADORA
FERROVIÀRIA.
E, para que esta EMPRESA possa receber bens federais, receber verbas federais e
trabalhar visando não o lucro, mas as necessidades da Nação, esta tem de ser
obrigatoriamente uma EMPRESA OPERADORA FERROVIÁRIA FEDERAL.
Sumarizando. Se desejarmos que estas linhas se mantenham, voltem à vida,
cresçam e tenham futuro, sem ameaças de retrocessos, temos de entregá-las a
uma OPERADORA FEDERAL.
No resto do mundo
Ao se desfazer, em 1996, da RFFSA, uma operadora ferroviária de âmbito
nacional, o Brasil passou a andar na contra-mão das experiências e modelos
internacionais mais bem sucedidos.
Todos os grandes países têm operadoras públicas ferroviárias de carga e
passageiros, com controle público centralizado de toda a malha. Na França,
Espanha, China, Rússia, Estados Unidos e Índia, o transporte de cargas e
passageiros é feito majoritariamente por empresas públicas, que recebem
subsídios para equalizar receitas e custos operacionais.
A maior empresa ferroviária européia, a Deutsche Bahn, é uma empresa pública
lucrativa e de alta produtividade, o governo alemão não abre mão do seu controle e só permitiu que 25% do seu capital fosse privado com o lançamento de ações.
Outra grande empresa ferroviária européia, a British Rail, sofreu um processo de
privatização que não funcionou e que teve que ser revisto. O principal problema foi
a falta de coordenação entre as mais de 100 unidades que passaram a ser
operadas pela empresas privadas, e ficou patente que é imprescindível uma
coordenação pública, e um controle centralizado da operação, a nível nacional.
Estados Unidos e Canadá têm empresas públicas de abrangência nacional que
operam o transporte ferroviário de passageiros, a AMTRAK e a VIA RAIL, e há
muito tempo descartaram a possibilidade de privatização destas empresas, que
atendem mais de 500 destinos.
O transporte de cargas é feito por empresas ferroviárias privadas, que estão
abertas a transportar qualquer tipo de carga, e submetem-se ao eficiente controle
e fiscalização de 2 agências reguladoras federais, uma para operação e outra para
segurança. O transporte de cargas em ambos países é feito por poucas empresas
privadas de grande porte, e por dezenas empresas ferroviárias de pequeno e
médio porte (short lines) que alimentam as linhas troncos de longa distância.
As operadoras de carga americana incentivam a criação e expansão de atividades
econômicas que possam demandar transporte ferroviário, em suas áreas de
influência.
A experiência da gestão das ferrovias européias e norte-americanas nos apresenta
algumas lições:
• O controle e a gestão da malha ferroviária necessariamente têm que ser
centralizado e de responsabilidade das autoridades públicas, as quais cabe a
responsabilidade de definir o melhor uso da via permanente para atender os interesses
regionais e nacionais, e não apenas o interesse de grandes demandadores de carga.
• A via permanente, material rodante e instalações são de propriedade pública, mas
a operação e a manutenção de partes da malha podem ser terceirizadas, deste que as
existam órgãos públicos regulamentadores e fiscalizadores independentes de injunções
políticas, e que sejam eficientes e transparentes;
• O poder concedente deve ter competência técnica e administrativa para
assumir a operação do material rodante e da manutenção da malha
ferroviária, quando por qualquer motivo o operador privado terceirizado
deixar de operar;
• As empresas ferroviárias públicas européias têm administração profissional
competente, em geral com imunidade a manipulações políticas e interesses
eleitoreiros;
• A manutenção da via permanente é uma obrigação do estado, da mesma forma que
a manutenção de ruas e rodovias também o é. Os valores gastos nestas atividades
não podem ser computados como subsídios;
• Embora muitas das ferrovias públicas européias e americanas sejam lucrativas,
para o atendimento a todas regiões e a toda população são necessários subsídios
governamentais. Nestes países a concessão de subsídios está vinculada a metas de
eficiência e produtividade que têm que atingidos pelas concessionárias ou
permissionárias.
• Os benefícios econômicos proporcionados por ferrovias subsidiadas, como o
aumento da receita tributária, incremento da competitividade, geração de emprego e
renda, desenvolvimento regional, fortalecimento da indústria de material ferroviário,
redução do consumo de combustíveis fósseis e de acidentes, e estímulo ao turismo,
superam em muito os montantes de subsídio. Ou seja, na realidade o subsídio é uma
forma de investimento que traz retornos para o conjunto da economia sob a forma de
externalidades positivas.
A opção por abandonar completamente a operação ferroviária fragilizou o país, e
não há como o Brasil não voltar a contar com uma operadora federal de
abrangência. Não há outra forma de conciliar, conservação, utilização, expansão,
controle, garantia de operação, e universalização com o atendimento aos
interesses verdadeiramente legítimos da Nação.
Alternativas
Nesta linha temos de saída 2 alternativas: uma empresa federal NOVA, ou, uma
empresa federal já EXISTENTE.
Não pode haver dúvidas na vantagem de uma empresa EXISTENTE sobre uma
empresa NOVA. Não se depende de criação alguma, com todas as demoras,
negociações, despesas, influências, etc que isto implica. Uma empresa já existente
pode começar a trabalhar “amanhã” nas novas linhas, bastando talvez um
pequeno e rápido acerto estatutário.
O Brasil tem hoje 3 empresas ferroviárias federais nesta linha. A CBTU, a
TRENSURB e a VALEC, cabendo definir a mais conveniente.
Quadro Comparativo das Características das Empresas Ferroviárias Nacionais Existentes
Obviamente a CBTU se desponta como a escolha, pois, embora as características
da TRENSURB e da CBTU sejam semelhantes, a primeira tem a grave deficiência
da operação em um único Estado. Já a VALEC, é uma empresa sem experiência
alguma em operação, se atendo até o momento ao gerenciamento de novas
implantações.
Na realidade a empresa escolhida será essencialmente um núcleo para a nova
operação.
Consideremos a escolha da CBTU como este núcleo. Apesar de ter atuação em
operação, manutenção, conservação, linha, etc, todas estas atuações serão
fortemente expandidas. Sua atuação passará a ter uma abrangência nacional, e
seu envolvimento não se restringirá a passageiros urbanos, mas também a outras
demandas. Por conta desta ampliação de escopo, sugere-se inclusive, uma
mudança de nome para acomodar esta transformação, que poderia passar a ser
CBTF- Companhia Brasileira de Transportes Ferroviários.
Atuação da CBTF (vamos manter este nome ao longo desta discussão)
Este momento, precipitado pelas devoluções da 4.131, é um momento critico, e
decisões têm de ser tomadas de forma emergencial. Não que a implantação de
uma CBTF seja coisa descartável e passageira. Muito ao contrário, a situação de
pânico, confusão, e de possibilidade de depredação que a própria 4.131 cria é
fruto único e exclusivo da inexistência de uma CBTF, que, caso existisse, receberia
automaticamente e sem dor alguma, as linhas devolvidas.
Então, incluindo a situação do momento atual, a CBTF,
• Recebe as linhas.
• Recebe o material rodante.
• Recebe as instalações, faixas de domínio, etc. Na realidade ela pode passar a ser a detentora imediata de TODO o patrimônio
ferroviário federal, móvel e imóvel, mesmo aquele ainda em concessão, de forma
que qualquer devolução posterior, já encontre o dono e receptor correto e definido.
São suas atribuições.
• Monitorar e resguardar todos os trechos recebidos, assim
como as Estações e todas as instalações.
• Manter as linhas em condições funcionais.
• Manter e recuperar o material rodante eventualmente
recebido.*
• Continuar as operações urbanas atuais.
• Implantar novas operações de passageiros urbanas,
metropolitanas, intermunicipais e interestaduais nas suas
linhas atuais e nas Devolvidas.
• Implantar novas operações de carga metropolitanas,
intermunicipais e interestaduais suas linhas atuais e nas
Devolvidas.
• Desenvolver outros usos, como locação, tração de
composições alheias, venda de direitos de passagem, etc.
• Operar CCO próprio das suas linhas.
• Apoiar à Polícia Ferroviária Federal na guarda da malha
total.
• Conveniar com entidades de ensino para uso e aproveito
das instalações como unidades de ensino profissional
ferroviário, nas áreas administrativas, manutenção, operação,
projeto, etc.
• Incentivar a intermodalidade de passageiros e cargas.
* Quanto a este item, deve-se lembrar que, assim como as linhas, as condições
do material rodante variam enormemente. Existe material rodando, material
recuperável para uso ferroviário, material recuperável para uso cultural e material
irrecuperável. Até agora, indiferentemente da situação na qual qualquer material,
linha ou instalação tenha sido entregue o DNIT, como esta Autarquia não usa ou
opera nada, seu destino é o abandono. Uma nova destinação, a um operador,
evitará que tudo se perca como tem sido inevitavelmente até agora.
Especificamente quanto às Linhas, imaginam-se as seguintes atribuições e
situações:
• Mantém as linhas atualmente em seu poder.
• Recebe as linhas Devolvidas e que forem sendo Devolvidas,
tanto as ainda transitáveis, quanto aquelas depredadas.
• Recebe as linhas abandonadas que não foram objeto de
Concessão.
• Dá manutenção e modernização nas linhas transitáveis.
• Trabalha pela recuperação das linhas depredadas.
• Trabalha na implantação de Novas linhas menores.
Como ela é uma EMPRESA PÚBLICA FEDERAL, suas fontes de receita serão:
• Aportes federais.
• Venda de direito de passagem.
• Operação de composições próprias.
• Implanta linhas de cargas, de passageiros ou mistas.
• 'Puxa' composições alheias.
• Aluga material rodante.
• Vende manutenção.
• Explora ativos.
• Recebe as indenizações impostas às Concessionárias por
descumprimento de Contrato, e usa na recomposição de linhas.
• Venda de inservíveis (de fato).
• Convênios.
• Investimentos compartilhados com outros entes estatais
ou particulares.
Quando se diz Implanta, na realidade deve-se ter em mente que a Implantação
pode ser diretamente sua ou de outro Operador. Na realidade, uma suas mais
importantes funções é também a de ser um Facilitador de Implantação.
Um dos mais caros objetivos a ser perseguido aqui deve ser aquele de ampliar o
número de Operadores. As vantagens desta ampliação são:
• Uso ampliado pela sociedade do patrimônio federal.
• Ocupação mais ampla e diversificada de nichos como
cargas, turismo, mistos, eventos, especiais, históricos,
comemorativos, etc.
• Os investimentos não serão unicamente estatais.
• Preços melhores e mais competitivos.
• Enorme ampliação dos postos de trabalho ligados à
ferrovia.
• Reversão do distanciamento da população para com a
ferrovia.
• Aceleração do processo de reversão e recuperação de
Estações, linhas e rodante abandonados.
• Ampliação das operações intermodais de carga e
passageiros.
Precificação no Modelo CBTF
A questão da precificação de itens como direito de passagem, aluguel de
máquinas e outros, deve ser precedida de cuidadosa avaliação para que, mesmo
dentro deste novo modelo, não voltemos a assistir à ditadura de umas poucas
operadoras sobre o resto da sociedade.
A cessão de direito de passagem deve se dar até o ponto onde outras operações,
que diversificam a linha, não sejam inviabilizadas.
Pelo mesmo motivo, Leilões como definidores de preços, também pode concorrer
para inviabilizar operações menores.
Não há sentido em receber linhas de volta de uma única operadora excludente, e
entregá-las para outra.
O modelo da precificação é um modelo aberto ainda.
Vantagens do Modelo CBTF
A CBTF deve ter gestão técnica e profissional, recursos humanos e financeiros
adequados, com o mínimo de interferências políticas. Não se trata aqui de evitar a
implantação de uma estrutura como esta, por conta dos pecados da extinta RFFSA.
Com a mesma facilidade com que alguns deles como o empreguismo são
prontamente elencados quando se fala em uma estrutura como esta, suas virtudes
são esquecidas. Apenas para citar uma, no Rio de Janeiro, seus trens de subúrbio
chegaram a carregar 1.200.000 de passageiros diários. Hoje, após 16 anos de
investimento e gerência privadas, nem 500.000 conseguem embarcar.
Embora uma estrutura de abrangência nacional como esta não seja uma coisa
trivial, usar o núcleo CBTU, como aqui sugerido, facilita e acelera tudo, pois,
afinal, trata-se apenas da ampliação do seu escopo.
A CBTU é uma Empresa Federal, pronta, em funcionamento, que opera em vários
Estados, possui corpo técnico, instalações, oficinas e procedimentos internos que
automaticamente darão suporte às novas funções incorporadas. Além disso, temos
o fato extremamente importante de que como ela já opera com passageiros, não
há rejeição alguma a atuação nesta área.
Esta é inclusive uma excelente oportunidade para corrigir as questões que
necessitam correção na CBTU atual, e também de substituir a discussão recorrente
da dissolução ou estadualização da CBTU em alguns locais, por uma discussão
totalmente diversa, ou seja, aquela onde ela é, ao contrário, fortalecida e
ampliada.
Igualmente importante, é o fato de que a ampliação de escopo proposta significa a
virtual eliminação de CONFLITOS em diversas operações urbanas. Ou seja, nas
cidades a CBTU já opera, a implantação de novas linhas e linhas regionais se dará
tudo dentro da mesma empresa, facilitando e agilizando a resolução de quaisquer
conflitos potenciais. A Valec deverá continuar a projetar e acompanhar a construção das grandes linhas nacionais
Fica para um segundo momento a discussão da possibilidade de unificação do
controle do uso e da operação mesmo destas grandes linhas dentro do sistema da
CBTF. Esta é uma discussão que pode esperar mais um pouco, não é urgente, e
que pode muito se beneficiar da experiência acumulada pela CBTF no
gerenciamento das linhas disponibilizadas neste primeiro momento.
Equipe
Francisco Oliveira
André Louis Tenuta [/color]